As esquerdas e a tentação fardada

Alguém da nossa turma, da minha e da sua, alguém de esquerda já defendeu intervenção militar contra o golpe de agosto. Eu conheço uns três que falam em voz alta: só há salvação se os militares tomarem o poder e o devolverem limpo e cheiroso ao povo. Não é tese de gente da direita bélica, como o general Mourão, é da esquerda mesmo.

Agora, circula por aí como um tiro de bazuca sem rumo a entrevista do historiador e cientista político Moniz Bandeira com o mesmo apelo. Ele acha que só os militares podem evitar que o jaburu-da-mala venda o Brasil com a ajuda dos 300 picaretas do Congresso.

Moniz Bandeira é um nacionalista desesperado. Mas tenta, como cientista, como pensador de esquerda, dar racionalidade à sua tese. Os militares entram, derrubam governo e Congresso e, tempos depois, restauram a democracia.

O golpe já foi dado, diz ele, o golpe é o jaburu no poder e os corruptos no Congresso, com seus aliados em todas as áreas. O jaburu representa uma ditadura. Os militares iriam apenas tirá-los de lá.

O historiador fala das máfias da direita, dos banqueiros, dos grandes empresários, do juiz Moro, do Judiciário seletivo, das privatizações, de Janot, do fim das leis trabalhistas e da Previdência, do desmonte do Estado. Entende-se seu desespero, que é o de todos nós.

Mas as perguntas básicas, óbvias, previsíveis, são sempre as mesmas. Os militares tomariam governo e Congresso para devolvê-los mais adiante? Mas devolver a quem? A um Congresso ainda mais reacionário? A que governo? Que democracia teríamos depois da “intervenção”?

Quando seria feita a devolução? Daqui a 30 anos? O que uma ‘intervenção” faria com os excessos do Judiciário, como lidariam com Sergio Moro e Gilmar Mendes? Esses continuariam intocáveis?

O que os militares fariam com os Vladimir Herzog de hoje? Com os sindicalistas, com os professores, com as esquerdas? O que fariam com os Bolsonaros e os pregadores do estupro como retórica política de desqualificação dos adversários?

Moniz Bandeira tem aliados importantes à esquerda. Percebe-se que algumas manifestações são mais emotivas, quase impulsivas, como esta do ex-senador José Paulo Bisol, em entrevista ao Flávio Ilha, para o jornal Extra Classe, em dezembro do ano passado:

“Pela gravidade da crise, me parece que já passou da hora do Exército intervir. De derrubar esse Congresso. A mentalidade militar é perigosa. Eu, por outro lado, não ficaria chateado se fechassem o Congresso [risos]. É o Congresso que está nos liquidando, não é o Temer. O presidente é só um porta-voz”.

Está claro que Bisol fala, num tom de quem brinca com a ideia, o que muita gente pensa e só alguns manifestam. Moniz Bandeira e Bisol podem ter desistido, como muitos desistiram, de acreditar que a nossa democracia degradada, golpeada, usurpada seja capaz de se reparar e se redimir.

A democracia não teria forças para seguir adiante. Antes, seria preciso que uma força maior a ajudasse. Seriam os militares? Por que têm tanques e armas? Mas o que mais têm os nossos generais hoje?

A democracia brasileira pós-eleições de 2018, se Lula ficar de fora, pode ser pior do que o arremedo de democracia que temos hoje. O Congresso da bancada BBB (Boi, Bíblia e Bala) não terá 300 picaretas na Câmara, mas 400.

Mesmo assim, respeitando as posições de Moniz Bandeira e de Bisol, estou certo de que os militares não iriam nos salvar, mas produzir ainda mais jaburus, Aécios, Cunhas, Geddeis, Serras, Padilhas, Gilmares Mendes, Bolsonaros, Sergios Moros e seus genéricos.

 

3 thoughts on “As esquerdas e a tentação fardada

    1. Esses caras são primários, não conseguiram aprender nada com a Ditadura Militar que teve aqui. A desculpa inicial sempre é a de “limpar” o país. Com poucos dias de “governo” as palavras mudam, quem tá no Poder apega-se a ele e demoram vinte anos para largar (mais ou menos) o osso. Esquerda que apóia esse tipo de coisa, francamente, deve ficar em casa de pijama. Assim como devem ficar em casa de pijama alguns generais saudosos daquele tempo. Ambos são sucatas lamentáveis do Brasil.

  1. A alternativa DEMOCRATICA seria o levante geral Do povo nas ruas e em BRASILIA, mas NOSsO povo se não estimulado OELA MIDIA não reage.
    Então qual a solução senão as FA?

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