MORO E A MORAL

A defesa mais rasa e apelativa da presença de Sergio Moro no futuro governo Bolsonaro é também a mais cínica. Moro seria o baluarte não só da Justiça, mas da moralidade.

Moro, dizem os nossos ‘liberais’, fez o que deveria ter feito e avançou no combate à corrupção. Pegou Lula e tudo e todos que tivessem relação com o PT. E os outros?

Os outros serão pegos mais tarde, não por Moro, que só poderia atuar na Lava-Jato, e a Lava-Jato foi feita para pegar Lula. Os outros são os outros.

Mas essa é a questão dita jurídica, misturada a questões políticas que não se esgotarão nunca. Arrede para um lado o debate em torno dessas controvérsias e sobre a condenação de Lula sem provas.

Pense agora na grande questão de fundo, que independe de conhecimentos jurídicos, mas de informações e referências elementares sobre condutas. Para os ‘liberais’ brasileiros, Moro teria, antes da solidez jurídica, o lastro dos cumpridores de missões moralizantes.

Sergio Moro pode até ter errado em alguns momentos para fazer cumprir sua determinação cívica, admitem os ‘liberais’(e errou muito, sem nunca ter sido punido). Mas o que prevaleceu sempre teria sido a busca do que é justo, do que é moralmente aceitável.

Tanto que a Lava-Jato abusou do apelo da moralidade, por manifestações de Moro, Deltan Dallagnol, de empresários, da imprensa. O próprio juiz admite que a exposição pública de seus atos (a divulgação do grampo de Lula e Dilma, por exemplo) busca lastro popular para o que ele faz, sempre em nome do bem maior.

E o bem maior é o fortalecimento do sentimento de moralidade entre as pessoas, para que esse dê respaldo às ações do Judiciário. Tudo inspirado nas lições da operação Mãos Limpas: torne público o que irá fortalecê-lo como justiceiro.

Pois o que deve se questionar agora é exatamente a questão moral da decisão de Moro de participar de um governo cujo futuro comandante marca suas falas e suas atitudes pelo oposto do que o líder da Lava-Jato tentou propagar.

Moro estará participando de um governo comandado por alguém sem nada do que o juiz diz defender. Como observou o jurista Wálter Maierovitch com uma pergunta-resposta: “Como você pode ser subordinado de uma pessoa como Bolsonaro?”.

Moro estará (ao lado de Magno Malta) sob a liderança de alguém que defende a violência como forma de combate à violência, que está sendo processado pelo Supremo por incentivar o estupro, que homenageia torturadores, que adora ditaduras, que desqualifica negros, gays e índios, que anuncia a perseguição de inimigos vermelhos, que recomenda às milícias estudantis a deduragem de professores subversivos, que ataca a imprensa, que acumulou com os filhos um patrimônio de R$ 15 milhões só em imóveis, que comandou uma campanha sustentada por mentiras de difamações disseminadas via WhatsApp e que se cerca de alguns dos nomes mais repulsivos da política.

Como um juiz que tentou construir sua reputação a partir da ideia de que seria moralmente inatacável vai se subordinar a alguém com o perfil, a história e a turma de Jair Bolsonaro?

Sergio Moro não é a expressão da moralidade, mas da adesão de um juiz a um projeto amoral e imoral. Os ‘liberais’ brasileiros tentarão, mas não têm o que dizer. E o juiz? O juiz estará logo repetindo que faz tudo em nome de Deus.

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