Os Juízes para a Democracia e a destruição da Previdência

Compartilho a nota da Associação Juízes para a Democracia (AJD) sobre a tal ‘reforma da Previdência’. Gostei muito da referência ao governo interino.

Antes, informo que assumo aqui o compromisso público de contribuir para que as posições e as atitudes da AJD sejam divulgadas, por se apresentarem como um contraponto ao pensamento mais conservador da magistratura brasileira e, principalmente, por defenderem um Judiciário que corresponda às expectativas e demandas da maioria, e não de uns poucos.

Eis a nota, que mostra com clareza essas posições:

“A Associação Juízes para a Democracia (AJD), entidade não governamental e sem fins corporativos, que tem dentre seus objetivos estatutários o respeito aos valores próprios do Estado Democrático de Direito, vem, diante da PEC (Projeto de Emenda Constitucional) da Reforma da Previdência, que propõe profundas alterações nas regras para a concessão de aposentadoria, tanto na esfera privada quanto na pública, manifestar-se nos seguintes termos:

1 – A tramitação da chamada Reforma da Previdência tem ocorrido sob inúmeros questionamentos quanto ao déficit de arrecadação alegado pelo Governo Federal Interino, assim como quanto à ausência de dados concretos que indiquem um suposto colapso do INSS. Não se revela razoável a realização de alterações tão contundentes, como as oficialmente propostas, sem que, antes, seja efetuada uma minuciosa investigação em todo o sistema previdenciário e de assistência social da União.

2 – A alteração das regras para a concessão da aposentadoria traz reflexos imediatos e significativos no mercado de trabalho e afeta a grande massa de trabalhadores, além de interferir na própria economia do País. Por isso, é temerário realizar a alteração proposta sem que haja, antes, um amplo diálogo com a sociedade, para apurar quais seriam as reais falhas do sistema. Menciona-se, como exemplo, o critério atual de “tempo de contribuição” que acaba por privilegiar categorias melhor posicionadas econômica e socialmente, em detrimento dos trabalhadores braçais, informais e terceirizados, que embora trabalhem mais anos e mais horas, dificilmente têm o recolhimento previdenciário regular por parte dos tomadores de serviços e patrões.

3 – O modelo proposto, na realidade, privilegia tão-somente o sistema financeiro que opera os fundos de aposentadoria privada, em detrimento daqueles que só contam com a própria força de trabalho para sustentar a si e a sua família e que só se socorrem da Previdência Social pública nos momentos de doença, incapacidade, ausência ou idade avançada.

4 – Se existisse, de fato, preocupação com a saúde financeira da Previdência Social, a reforma não teria sido proposta de modo a desestimular os mais jovens a ingressar no sistema (qual o incentivo, por exemplo, de um jovem de 16 anos pagar previdência se terá de trabalhar até os 65 anos de idade?). Da mesma forma, não haveria o apoio governamental à recentemente aprovada terceirização ampla, que fomenta a informalidade e a contratação por tempo determinado, gerando uma arrecadação, para o sistema, consideravelmente inferior àquela gerada pelo tradicional trabalhador com carteira assinada.

5- Por sua vez, a emenda do deputado Lincoln Portela (PRB-MG), que prevê a exclusão de magistrados e integrantes do Ministério Público do novo regime proposto pelo Governo Federal Interino, não concede legitimidade à Reforma da Previdência. A retirada de tais agentes da regra geral a que poderá se submeter a população, longe de ser uma solução para uma categoria, configuraria um privilégio injustificável, capaz de acarretar uma indesejável deslegitimação do Poder Judiciário e do Ministério Público, ampliando o distanciamento de tais instituições da realidade social.

6- A exclusão de servidores públicos estaduais e municipais da Reforma da Previdência também não legitima a reforma em questão. Trata-se de verdadeira armadilha que objetiva, de início, dividir a democrática resistência da sociedade civil ao projeto em debate e, em um segundo momento, submeter a categoria à pressão do governo federal sobre Estados e Municípios, normalmente dependentes de verbas oriundas da União.

7 – Qualquer alteração das regras previdenciárias, em geral, e da concessão da aposentadoria, em particular, deve ater-se à função principal do sistema previdenciário, que é manter os laços de solidariedade entre diferentes gerações e constituir esforços de poupança das gerações ativas. Considerando que tais objetivos não são levados em conta na Reforma da Previdência ora em discussão, a AJD clama pela sua não aprovação pelo Congresso Nacional.

São Paulo, 27 de março de 2017.

Associação Juízes para a Democracia”

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