A CAPA QUE O BRASIL MERECE

A extrema direita brasileira conseguiu agora o que o fascismo nacional perseguiu sem muito sucesso desde o integralismo dos anos 30: unir a retórica e a ação política do bolsonarismo aos exorcismos e à ação religiosa dos neopentecostais, com a linguagem e as ferramentas adequadas aos novos tempos. E assim conseguiu vencer uma eleição.

Plínio Salgado, o líder integralista da primeira metade do século 20, também defendia a família, a ordem, a propriedade e a religião, com o suporte da igreja católica conservadora. Os religiosos que apoiavam Salgado eram monges perto dos líderes evangélicos que dão lastro político a Bolsonaro.

E com uma diferença básica: o integralismo não aceitava discriminação étnica. Os integralistas não eram racistas, como são muitos (ou a maioria) dos militantes do bolsonarismo.

O integralismo sempre foi um movimento à margem do poder, com alguns momentos de aproximação com o getulismo. O bolsonarismo é um avanço. Aperfeiçoou o que a direita sempre teve de pior, apresentou-se como anti-sistema e antipolítica e elegeu um presidente.

Com a formação do novo governo, unem-se a extrema direita política, o militarismo e o fervor religioso. Tudo em nome do moralismo e do combate à corrupção, com Deus acima de todos.

Meu amigo Décio Freitas imaginava que, depois de Lula, o Brasil continuaria em linha reta até a eleição de um presidente negro. Em 2004, Bolsonaro estava no quarto mandato como deputado federal pelo Rio. Décio morreu naquele ano sem saber que Bolsonaro existia.

Hoje, Bolsonaro está na lista dos prováveis escolhidos como Personalidade do Ano da revista Time. Enquanto isso, o Brasil se firma, sem qualquer outro competidor à altura, como o país mais idiotizado de 2018.

Por isso, o personagem do ano deveria ser o idiota, o sujeito de classe média e seu grande parceiro, o pobre que se acha herdeiro do pensamento das elites e que foi decisivo na viabilização da candidatura de Bolsonaro.

O personagem do ano é o imbecil que trocou direitos trabalhistas, os recursos do petróleo, a saúde pública, a universidade pública, as liberdades e outras conquistas históricas pelo direito de ser moralista, de odiar e de poder ter uma arma em casa.

O idiota é o sujeito anônimo que, com seu voto, permite que Bolsonaro seja o que é e se transforme mais adiante no que promete vir a ser.

(A capa da Time é uma simulação com detalhe de uma das obras da série de figuras As Idiotas, do genial Iberê Camargo.)

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