A NOVA ONDA DO NEONAZISMO

Nos anos 80, o Rio Grande do Sul teve uma enxurrada de denúncias sobre organizações nazistas. Surgiram núcleos por todo lado. Um deles estaria na cidade onde eu morava.

Não revelo onde era, porque a conversa pode perder o foco e eu gosto demais dessa cidade. Não interessa a localidade, nem adianta ficar especulando sobre o nome (eu morei em três cidades nos anos 80), porque diziam que havia neonazistas por toda parte.

Eu era correspondente da Caldas Júnior. Procurei e encontrei um desses nazistas, filho do dono de uma pequena joalheria.

O cara pediu que o encontro fosse num bar. Tinha uns 25 anos e logo jogou na mesa, sem nenhuma discrição, uma pequena suástica de ouro que ele mesmo fazia na joalheria. Era para dependurar numa correntinha no pescoço, mas nem ele usava.

O sujeito parecia um bobão alegre, que nem sabia direito o que defendia. Perguntei se havia mais gente da turma dele com quem eu poderia falar.

Ele me indicou três jovens que até teriam comprado a suástica. Fui conferir, mas os outros saltaram fora.

Procurei e não achei o núcleo de nazistas. Avisei meu chefe Claiton Selistre, na Central do Interior da Caldas Júnior, sobre o que havia apurado.

A decisão foi a de aguardar para ver se surgiria algo mais consistente. Informei ao advogado Ben-Hur Mafra (que já havia me defendido num processo acionado contra mim por um grupo ligado à ditadura), para que ficássemos atentos, e não houve reportagem alguma.

O nazista era um guri que se achava nazista, numa cidade em que, na direção contrária, o debate pela democracia germinava nas esquinas, nas escolas e na universidade. A cidade não podia ser estigmatizada por um falastrão.

Não havia um grupo organizado de nazistas, mas um cara (quantos mais?) que se dizia nazista e nem usava a suástica que ele fazia.

Só que tempos depois uma revista de circulação nacional enviou um repórter à cidade e fez o que eu não havia feito. Estava lá, em muitas páginas, a cidade que fabricava suásticas. O bobalhão aparecia como líder do nazismo.

Era preciso achar os nazistas e torná-los organizados, unidos e numerosos, mesmo que sem nomes e rostos. Era o jornalismo pilantra, que sempre existiu e que não perde a viagem. Se o cara foi procurar nazistas, teria de encontrá-los.

Falo disso agora, com essa nova onda de nazistas e fascistas, e me pergunto sobre a dimensão da pregação desse pessoal, em termos de números, de organização e de influências.

Já fui alertado por um pesquisador, ao tratar do assunto aqui há muitos anos, que nós nos encarregamos de dizer que eles são muitos, quando são apenas alguns.

Não será por isso que vamos subestimá-los, de jeito nenhum. Mas não podemos ajudar a fortalecê-los.

E nada disso significa que nazistas, muitos com lastro ideológico e ação política, e que devem ser denunciados e enquadrados, sejam os mesmos racistas que se disseminam pelo Estado. Nada disso.

Um racista não é, necessariamente, um neonazista. Mas pode estar a caminho de vir a ser, se encontrar a sua turma.

Estamos diante do desafio de descobrir se, desta vez, o nazismo está mesmo se alastrando mais do que no tempo da ditadura. De racistas, já se sabe, o Rio Grande do Sul está cheio.

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