Ser jornalista voltou a ser perigoso

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Em 1977, quando a Fazenda Annoni foi ocupada pela primeira vez, eu e o fotógrafo Alan Vieira entramos na área como repórteres da Caldas Júnior, logo depois dos agricultores.
Passamos um dia misturados a eles para contar as histórias de gente que havia perdido suas terras para a barragem do Passo Real e pedia o direito de continuar plantando e criando porcos e galinhas.
A Folha da Manhã publicou uma página central com o nosso relato sobre a ocupação pela reforma agrária.
Se tivessem filmado nossa passagem por lá (não sei se não filmaram), correríamos o risco de sermos indiciados com alguns padres e agricultores. Eram grandes os riscos em 1977.
Penso no que fiz na Annoni e penso agora no caso do repórter Matheus Chaparini, do jornal Já, indiciado pela polícia por estar dentro da Secretaria da Fazenda quando da desocupação pela Brigada Militar, no dia 15 de junho.
Matheus incitou a ação dos estudantes que entraram no edifício para reclamar do descaso com a educação? Participou de depredações?
O que ele fez ou disse que possa comprometê-lo? O inquérito levou um mês para ficar pronto, deve estar bem amarrado. Dizem que há um vídeo que compromete o jornalista.
O que se sabe até agora é que outro vídeo mostra, em pelo menos dois momentos, que Matheus se identifica como repórter.
Relembro a primeira ocupação da Annoni (tantas vezes ocupada) e me imagino fazendo o que Matheus fez agora, cobrindo um fato o mais próximo possível dos seus protagonistas, e não da janelinha de uma unidade móvel.
Mas não consigo me imaginar. São tempos distintos demais. Em 1977, vivíamos ainda sob ditadura. Hoje, vivemos sob uma democracia de muitas faces.
Os jornalistas sabiam muito bem com quem estavam lidando em 1977.

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