JANINE RIBEIRO: A MENTIRA, A POLÍTICA E A ÉTICA

Compartilho abaixo um texto do professor Renato Janine Ribeiro sobre a controvérsia do ‘teje preso’ na CPI do Genocídio.

Foi publicado hoje no perfil do ex-ministro no Facebook. Sou citado (com muita honra) por causa de texto que publiquei no Face e aqui neste blog sobre o depoimento de ontem de Fábio Wajngarten.

É bom lembrar sempre que Janine é professor de Ética e Filosofia Política da Universidade de São Paulo.

É uma pequena aula sobre o dilema político e ético do prende-ou-não-prende o mentiroso.

O texto que escrevi é o que está no blog logo abaixo deste que compartilho.

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MENTIR OU NÃO MENTIR?

Renato Janine Ribeiro

O melhor comentário sobre o desempenho de Wajngarten (deve significar vinhedo, ao pé da letra “jardim de vinhas”, em alemão, talvez em ídiche) foi do Coronel Siqueira, um personagem fictício que se finge de extrema-direita:

“Não pode mentir na CPI, mas se quiser pode.”

Ficou a pergunta: ele deveria ter sido preso? Interessante olhar O Globo de hoje. Merval Pereira faz uma análise que é similar à de outros articulistas, de outros jornais (penso em Tereza Cruvinel, no 247, do lado oposto de Merval): foi bom ele não ser preso. Teria sido transformado em vítima. Daria a impressão de que a CPI é um órgão de oposição ao governo, não um instrumento constitucional de apuração da verdade. Em suma, politizaria demais o exame dos fatos. Mais do que isso, politizaria cedo demais. É como se colocassem o carro na frente dos bois. O importante é ir somando evidências e, somente depois, tirar as consequências delas.

Bem, Merval não disse tudo isso, mas estou desenvolvendo uma argumentação que enfatiza o caráter político da CPI. Assim, paradoxalmente, para a CPI ter efeitos políticos, é importante ela não se politizar cedo demais.

Já Malu Gaspar diz o que eu resumo assim: vergonha. Agora tudo é permitido. Um depoente pode mentir sem pagar por isso. Ou um senador pode chamar o colega de “vagabundo” e fica por isso mesmo. Faz pensar na frase famosa de Dostoievski: se Deus não existe, tudo é permitido. Poderíamos atualizá-la: se não há regras mínimas de decoro, decência, legalidade, então é o vale tudo. Ou ainda a piada antiga, brasileira: restaure-se a moralidade – ou locupletemo-nos todos (para quem não entender o verbo hoje menos conhecido, mas muito saboroso: quer dizer enfiar as mãos no dinheiro público sem pudor).

Vejam a diferença entre uma abordagem mais ética e outra mais política do mesmo fato. Malu Gaspar (como o jornalista Moisés Mendes, no Facebook) têm toda a razão do ponto de vista moral. E da moral pública. É uma vergonha para o Brasil ver o que viu, sem punição ao mentiroso ou ao grosseiro.

Mas politicamente as coisas são um pouco diferentes. Se Wajngarten saísse preso, ou se o filho do presidente sofresse de imediato sanções, seria fácil a Bolsoesfera alegar perseguição etc etc. Por isso, é melhor acumular evidencias.

Porém, o que eu queria aqui era indicar a diferença de dois tipos de raciocínio. Para todos nós, o raciocínio ético, moral, de Malu Gaspar e Moisés Mendes faz todo o sentido. Ele mexe com nossos instintos, com nossos sentimentos. Mas, na política, uma certa frieza é praxe e talvez necessidade.

Agora, quando terminar este pesadelo, para recompormos o senso da decência pública, será preciso levar muito em conta o que disseram Malu Gaspar e Moisés Mendes. Temos que recuperar o senso da indignação com o que é errado. Temos que restaurar o senso da vergonha.

2 thoughts on “JANINE RIBEIRO: A MENTIRA, A POLÍTICA E A ÉTICA

  1. Se Lewandowski não der o HC ao general fujão, com a pressão dos senadores, ele vai se comprometer na oitiva. Se o presidente da CPI mantiver a decisão de não prender ninguém e encaminhar os casos envolvendo depoimentos mentirosos ao MP, resta saber se este tratará com a rapidez necessária ou se demorará anos para que a sociedade tenha uma resposta.

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