O CHESTER E O RACISMO

O controverso comercial de Natal da Perdigão não deveria causar tanta surpresa num país em que o racismo é estimulado por políticos eleitos e está cada vez mais disseminado.

O vídeo em que uma família alegre e bem de vida (branca) permite, ao comprar um chester, que a Perdigão doe outro chester a uma família pobre (negra) deve ter passado, desde a ideia do publicitário criador, até a finalização do filme, por dezenas de cabeças.

Passou na agência pelos publicitários que participaram do desenvolvimento da ideia. Na própria Perdigão, que aprovou o roteiro, na produtora do vídeo, entre atores, figurantes, técnicos, diretores, editores, todos participaram e viram o vídeo que depois foi ao ar.

E ninguém disse: mas peraí, que história é essa de brancos doando chester para negros? Por que sempre os negros como beneficiários do altruísmo dos brancos?

Por que isso sempre no Natal, no Ano Novo? Mas por que (essa é a pergunta) ninguém vê que aquilo é uma aberração, que somente será percebida quando vai ao ar? Por ignorância? Por dessensibilização social?

O brasileiro perdeu a capacidade de fazer essas avaliações? A propaganda brasileira está tão doente quanto outras áreas do país? Está tão doente quanto a política?

O comercial de Perdigão reproduz ao avesso o que aconteceu anos atrás com aquele vídeo da propaganda da Caixa em que Machado de Assis é branco. Se é o maior escritor brasileiro, se é um gênio, tem que ser branco.

Assim como para a Perdigão, se é para fazer altruísmo, que seja de branco ajudando negro. O altruísmo marqueteiro é o Brasil cínico e benemerente na sua expressão mais assustadora.

A família negra não pode comprar seu chester, mas pode ganhar de uma família branca. Como muitos bacanas que usam a filantropia para dizer que tudo deve ficar como está.

 

2 thoughts on “O CHESTER E O RACISMO

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