OS MEDÍOCRES, AS ARMAS E O GOLPE

O roteiro continua sendo escrito pelo grande escritor Imponderável de Almeida. O presidente da mais alta Corte do país adoece, é internado e operado e está com sintoma de Covid-19, mas não tem Covid-19.

O presidente da República visita o xerife que pode apontar os crimes que ele cometeu e desencadear um processo com desfecho que, dizem, teria consequências imprevisíveis.

E o juiz eleitoral faz um discurso assegurando que, ao contrário do que muita gente pensa, não haverá golpe e os bandidos não tomarão conta da cidade.

É isso o que se passa. Dias Toffoli internado. Bolsonaro visitando Augusto Aras. E Luis Roberto Barroso mandando ver numa fala corajosa, depois dos ataques ao Supremo.

Há muitas frases boas no discurso que Barroso fez ao assumir a presidência do Tribunal Superior Eleitoral.

Esta é a primeira:

“A educação, mais que tudo, não pode ser capturada pela mediocridade, pela grosseria e por visões pré-iluministas do mundo”.

É dirigida, claro, a Bolsonaro, Weintraub e aos demais que quiserem vestir a carapuça, ou seja, quase todos os ministros e o pessoal do entorno.

E esta é a segunda:

“Precisamos armar o povo com educação, cultura e ciência”.

Aí nem precisa explicação. Bolsonaro quer armar o povo com sabe-se lá o quê, mas não há metralhadoras nem flechas para todos. Que parte do povo seria armada e contra quem?

Barroso marcou posição forte na sequência dos acontecimentos. Aproveitou a posse no TSE para mandar vários recados. O principal é que o TSE e o Supremo não só não aceitam como não temem as ameaças de golpe.

E o TSE agora sob o comando de Barroso vai julgar oito ações que pedem a cassação de Bolsonaro e Mourão por crimes eleitorais.

Aos poucos, vamos nos dando conta de que poucos devem estar temendo mesmo a ameaça de golpe. Que golpe seria esse, como funcionaria? Com que consequências imprevisíveis?

É tudo pastelão demais para ser levado a sério, desde a nota de Augusto Heleno ao telegrama dos militares reformados falando em guerra civil.

E ontem ainda teve Bolsonaro divulgando um vídeo do Charlton Heston, do tempo em que ele fazia Moisés no cinema, sobre armas para o povo.

A ideia de golpe talvez nem seja mais o gato que subiu no telhado. Nesse caso, o gato já se atirou do telhado e ninguém mais sabe onde anda o gato.

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O CONSELHEIRO COLLOR
Nesse clima, foi divertido ver ontem na TV da Folha a entrevista de Collor de Mello. Parecia uma conversa com um humorista que imitava Collor.

O hoje senador admitiu que fez tudo errado quando assumiu a presidência, desde o plano que confiscou a poupança. Errou ao desafiar o Congresso, errou ao subestimar os adversários.

Errou ao tentar buscar uma conciliação tardia e ficar apenas com o PFL de sempre. Errou ao tentar desafiar os humores das ruas e atiçar os caras-pintadas.

Foi até divertido ver Collor, o sujeito corrido do poder talvez mais por incompetência política do que por corrupção, dar conselhos a Bolsonaro.

Collor parecia um estadista. Bolsonaro não deve praticar o jogo do toma-lá-dá-cá, porque não vai dar certo, não pode agir nas sombras, não pode tentar buscar apoio de manifestações cada vez mais “rarefeitas” (usou essa palavra) diante do Planalto, não deve continuar desafiando as instituições, não pode agir como chefe de uma família.

E aí veio a frase que fecha o raciocínio de Collor como conselheiro de Bolsonaro: tente o diálogo com todos e fuja de ideias totalitárias, porque isso não dará certo.

“Bolsonaro age por instinto”, disse Collor. “Esse instinto se coordena com um método. Esse método nos conduz no seu limite ao fascismo”.

Collor, quem diria, alia-se ao coro aos que tentam afastar Bolsonaro e seus fardados da ideia de golpe. Não tem como funcionar.

O ex-presidente admitiu que, quando tentou se safar, quando buscou apoio precário no Congresso, já era tarde. Não disse, nem precisava dizer, que essa pode ser hoje a situação de Bolsonaro.
Amanhã, a Folha poderia ouvir os conselhos de Michel Temer para Bolsonaro.

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