Quando os mortos não têm nome, rosto e história

Há uma chamada de capa no jornal Clarín, de Buenos Aires, sobre o temporal da semana passada em Baía Blanca, que se parece muito, como tragédia climática, com o que aconteceu no ano passado no Rio Grande do Sul. Essa é a chamada:

“Um a um, quem são os 16 mortos pela inundação”.

O jornal cumpre a missão clássica do jornalismo. Dar o nome e contar as histórias de cada vítima. Como se faz sempre em situações semelhantes, quando isso é numericamente possível.

Foi o que jornalismo fez também com as 183 pessoas mortas na tragédia que, no começo, foi subestimada pelas autoridades estaduais e municipais gaúchas. E continua sendo subestimada como aviso de que novos episódios podem acontecer.

Pois nem sempre sabemos dessas vidas. Pouco ou quase nada se sabe dos nomes e das vítimas do massacre israelense em Gaza. Não sabemos os nomes de crianças, mulheres e idosos mortos.

Sabemos até os nomes, as histórias e os dramas familiares dos israelenses que foram levados como reféns pelo Hamas. Mas não sabemos o sobrenome de famílias inteiras dizimadas pelo neonazismo em Gaza.

Não sabemos nada sobre os prisioneiros palestinos libertados por Israel, entre os quais há muitas crianças. É a diferença.

E mesmo que lá em Gaza, onde o massacre ainda acontece, agora pelo corte de suprimentos, os israelenses tenham matado mais de 80 jornalistas. Havia e ainda há jornalistas em Gaza.

Mas as notícias que eles publicavam e que seus colegas continuam tentando publicar não chegam ao mundão longe dali.

A imprensa ocidental não tem o menor o interesse em contar pelo menos algumas dessas 50 mil histórias e se desculpa com o pretexto de que não tem acesso a Gaza.

O jornalismo das corporações sempre tem desculpas. E essa é bem razoável. Se entrarem em Gaza, os repórteres podem ser mortos pelos ataques de Netanyahu, porque essa não é uma guerra, mas uma chacina.

One thought on “Quando os mortos não têm nome, rosto e história

  1. “A imprensa ocidental não tem o menor o interesse em contar pelo menos algumas dessas 50 mil histórias e se desculpa com o pretexto de que não tem acesso a Gaza.”

    É verdade, a imprensa ocidental não tem interesse nenhum e dá essas desculpas esfarrapadas. A imprensa ocidental vive prelopagando em seus editoriais a aniquilação completa o mais rápido possível de Gaza.

    Uma imprensa progressista e humanista, com certeza, contaria a história de cada um dos 50 mil palestinos mortos. Note que a imprensa contou a história de todos os israelenses sequestrados e mortos, totalizando por volta de 1500 biografias: o que faziam, onde moravam, como era a vida em família, a formação, os sonhos, os amores e tudo. Mas para os palestinos a imprensa ocidental cobre de Bibi uma resposta rápida e fatal.

    É lamentável a imprensar ter aderido ao hitlerismo dessa maneira! É algo terrível…

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