A solidão do filho de Alexandre de Moraes

O filho do ministro Alexandre de Moraes pode oferecer seu caso não só como pauta ao jornalismo, mas como objeto de estudo aos que aplicam suas ciências na tentativa de entender o período que vivemos desde a ascensão do fascismo.

As ciências políticas e sociais que tudo explicavam ainda devem ajudar a esclarecer como, em tempos de violência extrema e muitas vezes impune, as reações às agressões ficam sempre aquém do ataque perpetrado.

Incluindo aqui a violência que se manifesta publicamente, muitas vezes direcionada, com alvo escolhido, como essa que aconteceu no aeroporto de Roma.

O filho do ministro do STF, que reagiu em defesa do pai, num gesto natural de proteção a quem o protege, poderá dizer, agora ou daqui a alguns anos, como se sentiu enfrentando sozinho os agressores que vieram de turma para cima de Moraes.

Quem, dos brasileiros que estavam por perto, fez um gesto, um só, de solidariedade ao rapaz de 27 anos? Ou não havia mais nenhum brasileiro no entorno de uma área de embarque para o Brasil?

Por que as agressões públicas, cada vez mais usadas como tática pelo extremismo bolsonarista, nunca são contidas por quem está por perto? Por medo? Por covardia? Por excesso de precaução?

Por que a deputada Maria do Rosário nunca teve um macho que a socorresse quando foi agredida por Bolsonaro? Os machos temem as reações das feministas?

Por que a modelo Helena Gomes levou safanões e ouviu ameaças do milionário Thiago Brennand, numa academia de ginástica de São Paulo, e os machos em volta não a socorreram?

Por que só as mulheres da academia salvaram Helena da violência do homem acusado de estuprar e espancar quem o rejeitava?

Por que todos os episódios recentes de agressões públicas a autoridades, em aviões, praças, aeroportos, em qualquer lugar, não provocaram gestos de defesa de quem está por perto? Sim, falamos de movimentos físicos, de imposição, de contenção ou de prevenção diante de um ataque.

Deve ter sido de abandono o sentimento do filho de Alexandre de Moraes, no aeroporto de Roma, enquanto o pai era cercado pela família paulista, sabendo que o ministro não poderia cair na arapuca de reagir?

No sábado passado, em Fortaleza, um homem fez uma saudação nazista diante do palco da banda Sepultura e foi espancado por quem estava ao redor. Porque ofendeu Derrick Green, o cantor negro da banda.

O nazista usou uma artimanha clássica do fascismo, que é a aposta na possibilidade de confronto como tática do desespero.

Um fascista agressor não quer apenas extravasar seu ódio, quando ataca um cantor negro ou uma alta autoridade da República. Quer ter a chance de ser agredido, de preferência com socos e tapas. Se tiver pontapé, melhor.

O fascista está em busca da chance de levar uma surra, desde muito antes da invasão de Brasília no 8 de janeiro. Por isso os manés se frustraram. A destruição do Congresso, do Planalto e do Supremo não teve cassetetes.

Há poucos dias, um sujeito, anunciando-se como fascista, disse no campus da Universidade Federal de Santa Catarina que o fascismo está vivo.

Um outro, acompanhante do que fazia o vídeo como fascista, teria apanhado de estudantes esquerdistas e até mostrou em foto os ferimentos aperfeiçoados com photoshop.

Uma agressão é o troféu que eles buscam, em Florianópolis ou na Europa, para que se apresentem depois como vítimas das crueldades de inimigos ferozes. Por isso não são contidos?

Ficou claro, no depoimento do homem que cercou Moraes no aeroporto, segundo versão do seu advogado, que a tentativa agora é a de transformar o filho do ministro em agressor.

Por que eles se arriscam a inverter a acusação? Arriscam-se porque, além do rapaz que procurou proteger o pai, ninguém mais tentou conter a turba.

É a realidade. Não se trata de sugerir que a violência do fascismo seja combatida com a violência dos democratas. Nada disso.

O que se espera é que as vozes da indignação se manifestem não só horas ou dias depois, em notinhas e manifestos, mas no momento em que a agressão é consumada.

Não para dar tapas e socos, mas para impedir que os agressores continuem agindo livremente, sem qualquer reação às suas investidas. Que em algum momento apareça alguém que grite: parem.

O grupo de Roma, mesmo que alegue desconhecimento sobre o filho do ministro, esteve com um troféu perto da mão, ao perceber que o jovem poderia passar do limite ao defender o pai.

Eles não sabiam mesmo que o rapaz era filho de Moraes? Acharam que um jovem, sem vínculo nenhum com o agredido, estaria tentando impedir o cerco a um desconhecido?

Essa figura protetora ainda não existe. Agressores em busca de algo mais do que um entrevero (como definem o caso de Roma) sabem que ninguém tenta conter um ataque fascista no momento em que esse acontece. É triste, é incômodo, é constrangedor. Mas assim é.

 

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