O CHAPÉU DE MORO E A PERFORMANCE DE MICHELLE

É preciso ter cuidado para falar da performance de Michelle Bolsonaro, no momento em que um grupo de religiosos comemorava a aprovação de André Mendonça para o Supremo.

Os patrulheiros de plantão, inclusive nas esquerdas, podem dizer que as pessoas assombradas com aquelas estranhas falas em língua incompreensível são preconceituosas com os neopentecostais.

Assim como alguns me criticaram ontem quando escrevi, em texto no Face Book, que Sergio Moro ficou com cara de ajudante de cangaceiro ao vestir o chapéu dos nordestinos.

Reafirmo o que disse, porque a zombaria faz parte da resistência. Com uma ressalva. Em nenhum momento chamei de chapéu de cangaceiro, jamais chamaria. Como não chamaria o gibão de roupa de cangaceiro.

Mas não estou entre os que sacralizam objetos em nome de uma pretensa identificação de purezas regionais.

Chapéu e gibão também são usados por coronéis nordestinos nascidos e criados na caatinga e por cangaceiros e outros bandidos, inclusive eleitos.

Assim como chapéu, botas e bombacha gaúchas, que fardaram degoladores nas guerras internas, não podem ser sacralizadas.

A bombacha é hoje a representação não do conservadorismo, mas de boa parte do fascismo gaúcho. Bandidos miúdos e graúdos, se for preciso, se vestem até de anjo.

Vestimentas e adereços gaúchos estão associados ao bolsonarismo que se disseminou pelo Estado. A extrema direita também é bombachuda, muito bombachuda.

Então, vamos parar com essa frescura de que, se alguém colocou um chapéu de nordestino, não pode ter ficado com cara de cangaceiro.

Pode ficar inclusive com a cara de ajudante de líder da Gangue do Relho, se colocar um chapéu de gaúcho.

Escrevo e peço para que não me convidem para romantizar o cangaço (que alguns consideram não numa bandidagem, mas uma militância de esquerdismo primitivo) e muito menos me chamem para glamourizar esse gauchismo da ideologia do relho.

Estamos em tempos de avanço de extremismos e fundamentalismos. É natural que alguns tenham se assustado com a situação em que a mulher de Bolsonaro parece entrar em transe ao lado do futuro ministro do Supremo.

Michelle ergue os braços, grita aleluia e glória a Deus, pula e então fala numa língua que talvez só eles ali entendessem.

Seria uma representação do que está na Bíblia, que se refere, no Novo Testamento (em Atos) aos que, tomados pelo Espírito Santo, falam noutras línguas, porque o Espírito Santo os autoriza a falar.

Religiosos não podem falar outras línguas e fazer rituais que nem todos entendem? Claro que podem. Até pouco tempo, Deus mandava que seus porta-vozes falassem em latim.

Mas a cena toda é estranha, no contexto da escolha de um bolsonarista juramentado para o mais alto cargo da Justiça.

Não é estranho que a mulher do presidente grite palavras aparentemente sem sentido, quando o que se evidencia ali é a mistura de Estado, religião, família, Justiça e outros interesses e sentimentos?

Michelle Bolsonaro disse no Twitter que os críticos praticaram intolerância religiosa. E os que a aplaudiram, ao lado de engajados ideologicamente a uma religião agora misturada ao Judiciário, teriam praticado o quê?

Para repetir uma palavra já gasta, tudo está normalizado pelo bolsonarismo, desde o aviso explícito de Bolsonaro de que André Mendonça seria o seu emissário terrivelmente evangélico no STF.

Leiam o que Michelle escreveu a respeito:

“Usarei 1 Coríntios 2:10-14 para responder a intolerância religiosa e o desamor de muitos a meu respeito, por celebrar a vitória do meu irmão em Cristo André Mendonça. Ora, o homem natural não compreende as coisas do espírito de Deus, porque lhe parecem loucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente”.

Confesso que estou entre os que não entendem. Até porque, segundo explicação de quem entende, apenas Deus é capaz de entender aquela língua. E os Bolsonaros, como se sabe, conversam diretamente com Deus.

O vídeo da oração de Michelle, para quem ainda não viu, está logo abaixo:

4 thoughts on “O CHAPÉU DE MORO E A PERFORMANCE DE MICHELLE

  1. Olha, Moisés, quando o Espírito Santo baixou nos apóstolos, na Virgem Maria (e também na Maria madalena, que estava escondida no santinho) e ensinou-lhe línguas para que eles pregassem pelo mundo, provavelmente essas línguas eram o grego, o árabe e o latim, porque era o que se falava pelo mediterrâneo.

  2. Bom, o Tomé viajou pelo mundo, passou pelas Américas, e acabou no japão. Devia falar Guarani, Tupi, Gê, Aymara, Nahuatl e navajo, no mínimo. Mas o Tomé era fiscal do imposto de renda, devia falar até Mandarim.

  3. Mas, pela constituição, o serviço público não deveria ser laico? Para mim, se comportam como bandos de histéric@s e de fanátic@s.

  4. PelamordeDeus! Línguas? Falando com Deus e Deus entendendo? O único que entendo dali é um bando de PATÉTICOS religiosos fazendo política . E na minha fala em línguas ….. MIMIMI ! e junta esse bando de canceladores de esquerda e direita e temos a idiotia autoritária geral .

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