O erro

Luciano Alabarse, diretor de teatro, secretário de Cultura de Canoas, conta hoje como foi a sua porta na cara, que não é bem uma porta na cara, mas uma porta inesperada – ou várias portas abertas ao mesmo tempo.

O ERRO

Luciano Alabarse

O início de tudo virou minha vida de ponta-cabeça. Até hoje não sei se um anjo ou um demônio, o próprio Deus quem sabe, agiu para mudar totalmente o rumo da minha vida.

Explico: menino pobre da vila Bom Jesus, filho de dono de armazém, sonhei e me preparei a vida inteira pra ser professor de Letras. Era o que eu queria pra mim.

Preenchi a ficha do meu vestibular na UFRGS no ano em que era introduzido o Ciclo Básico. Passei, e isso não foi surpresa pra ninguém. Mas como preenchi o “x” uma linha abaixo, ao invés de passar em Letras, passei no curso da linha abaixo, Artes Cênicas.

Meu pai disse que isso não era curso pra ninguém, que não me daria mais um centavo, que eu teria de me virar sozinho se levasse adiante essa ideia estapafúrdia.

Não adiantou explicar que seria melhor fazer um ano do curso, assim não iria perder a vaga. Meu pai não aceitou e fechou qualquer possibilidade de diálogo. Teimoso, resolvi encarar aquela reviravolta surpreendente a ficar um ano sem fazer nada.

Para aguentar o tranco paterno, me inscrevi no concurso da Justiça Federal, passei e menos de um mês depois estava trabalhando em um emprego nunca pensado e fazendo uma faculdade nunca imaginada.

Graças à radicalidade paterna, encontrei no Direito e no Teatro as pernas que me fariam andar profissionalmente o resto da minha vida.

Hoje, aposentado do Tribunal Federal e super na ativa nos palcos de Porto Alegre, lembro essa história sem saber se alguém superior me fechou a porta na cara ou me abriu o que eu sequer imaginaria.

Certo é que, como um legítimo personagem de tragédia grega, tive de errar pra encontrar meu destino. E até hoje não sei quem ou o quê me levou a um erro tão absoluto e que definiu minha vida profissional de forma irreversível.