O ÚLTIMO GENERAL
Publiquei esse texto na edição de número 7 do jornal O Grifo, da Grafar, a cooperativa dos cartunistas de Porto Alegre.
É sobre uma cena de um futuro próximo e imaginário, mesmo que o país já viva numa espécie de distopia.
Às vezes, precisamos inventar algumas loucuras, para poder suportar as loucuras da realidade.
A ilustração é do Lucas Levitan.
O ÚLTIMO GENERAL
Bolsonaro telefonava para Pedro Bial, para acertar uma entrevista sem detector, quando Augusto Heleno entrou no gabinete e foi logo anunciando:
– Estou caindo da boca.
– Que história é essa, meu?
Heleno sentou-se e começou a se lamentar.
– Você mandou 15 generais embora. Dispensou meus amigos comandantes. Botou na rua até o nosso ministro da Defesa. Não dá mais.
Bolsonaro levantou-se nervoso e começou a dizer que não é bem assim, para com isso daí, vamos conversar, você é o esteio desse governo.
Augusto Heleno o interrompeu.
– Eu sou o último general ao teu lado.
– Os outros saíram porque quiseram. Este era um governo de vocês – disse Bolsonaro.
Heleno não gostou da rispidez da reposta e também se levantou.
– Nós fomos apenas teus empregados.
– Não, senhor. Vocês são do esquema.
Heleno ergueu a voz:
– Do esquema são os milicianos.
Bolsonaro argumentou que o projeto era de um governo militar, sustentado e orientado pelos militares.
Heleno contestava e dizia que, se fosse assim, Bolsonaro não teria mandado um batalhão de generais embora.
Heleno chegou mais perto de Bolsonaro e tentou se impor.
– Você manchou a imagem das Forças Armadas.
– Eu? – exclamou Bolsonaro em tom de deboche.
– Olha o que você fez. Você forçou o Exército a produzir cloroquina. Transformou o Pazuello em vendedor de cloroquina.
– Você vem disser isso agora? Vocês são cúmplices de tudo – gritou Bolsonaro.
Heleno dirigiu-se até a porta e Bolsonaro o chamou de volta.
– Você não pode me abandonar. O Exército é meu. E precisamos aplicar o golpe.
– Conheço essa conversa mole – disse o general, abrindo a porta.
– Você vai se arrepender – gritou Bolsonaro.
Heleno bateu a porta, que logo foi aberta de novo. Era Eduardo, que chegou anunciando.
– Pedro Bial quer entrevistá-lo amanhã sobre a organização do golpe. A Globo aderiu e está buscando patrocinadores.
Bolsonaro sentou-se, passou a mão na cabeça e contou a Dudu que Heleno estava indo embora. Iria ficar sem generais para o golpe.
Quando o filho pensou em abrir a boca para falar de uma ideia, Bolsonaro abriu a boca junto e os dois gritaram as mesmas palavras ao mesmo tempo, com a mesma ideia.
– Eureka!!!! Pazuello!!!!
O filho saiu porta afora gritando eureka, eureka, e Bolsonaro retornou ao celular e disparou um Whats:
“Bial meu querido meu jornalista preferido… estarei aí amanhã com o Pazuello…. mas sem detector talkei???? kkkkkkk!!!!….”
(Abaixo, o link para o jornal O Grifo)
https://drive.google.com/file/d/1P5oIim3dZu_vSQm27E-k-GlOKtA7_3ei/view