O tempo anda de mãos dadas com os criminosos

A performance de Anderson Torres na CPI do Golpe deve ter sido vista, na transmissão ao vivo, por muitos dos 40 bolsonaristas que poderão ser condenados a até 30 anos de prisão pela invasão de Brasília no 8 de janeiro.

Esses 40 são da primeira lista de nomes encaminhados essa semana pelo Ministério Público ao Supremo, com pedido de “punições exemplares”.

Todos os 40 sabem do que são acusados. Mas o homem que já atuou como delegado da Polícia Federal, ministro da Justiça e secretário de Segurança do Distrito Federal não sabe.

Foi o que Torres admitiu à CPI, diante de uma pergunta do também delegado da PF e senador Fabiano Contarato. Disse que está sendo investigado “por alguns crimes, mas ainda não há imputação nenhuma”.

O delegado ainda não foi denunciado pelo Ministério Público. Mesmo assim, Contarato quis saber que tipos penais estariam, em tese, sendo atribuídos à conduta dele.

Torres disse achar que as acusações eram referentes aos atos do 8 de janeiro e que, por suposição, envolveriam omissão.

O que, no caso, é a omissão grave de uma autoridade diante de uma ameaça de golpe, levada adiante e fracassada. E o que mais? Ainda não se sabe.

Foi isso o que os 40 invasores já a caminho do sacrifício, como manés a serviço do golpe, ouviram do depoimento do delegado na condição de testemunha.

Torres disse que a minuta com o detalhamento do golpe estava na sua casa porque, por um descuido de alguém, não foi para o lixo.

Que não sabia de nada de grave que pudesse acontecer naquele domingo. Que viajou dois dias antes para os Estados Unidos, onde Bolsonaro estava, por se sentir tranquilo. E que lá perdeu o celular, voltou e foi preso.

E que não sabe direito do que poderá ser acusado. Porque não há ainda nada formalizado contra ele.

Mas já há contra os 40 manés. Destruição de patrimônio público, crimes contra o patrimônio cultural, associação criminosa e abolição violenta do estado democrático de direito, golpe de Estado e incitação à animosidade entre as Forças Armadas contra os poderes constitucionais.

Muitos dos réus do 8 de janeiro não sabiam distinguir os prédios do Congresso, do Supremo e do Planalto. São criminosos, são violentos, mas sempre estiveram distantes do núcleo do golpe e muito longe do topo da pirâmide do fascismo.

Não está entre eles o grupo dos grandes financiadores das ações da extrema direita em todas as frentes, que atuam desde muito antes dos acampamentos e dos bloqueios de estradas.

A explicação razoável para o fato de que alguns manés já estão com um pé na cadeia, enquanto Torres tem apenas uma perna com tornozeleira, é dada pela complexidade do caso do delegado.

Os manés foram flagrados cometendo os crimes. Torres saiu de férias depois de planejar os crimes dos quais deverá ser acusado formalmente. Mas quando será denunciado?

Quando teremos, para que as expectativas não sejam frustradas, um manezão denunciado e condenado? Quando teremos o direito de desfrutar do sentimento legítimo da reparação?

É a questão posta diante de todos nós e do sistema de Justiça, enquanto o tempo corre quase sempre de mãos dadas com os criminosos.

O tempo certo para chegar às provas e à formulação de denúncias irrefutáveis pode ser também, se passar do ponto, o tempo da impunidade.

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