É silêncio demais

Jornalistas quietos, constrangidos e assustados com a evolução do ambiente pós-golpe deveriam ler A Cozinha Venenosa (Editora Três Estrelas), de Silvia Bittencourt. Silvia, uma grande jornalista brasileira, mora desde 1991 na Alemanha.

O livro conta como Hitler e seus cúmplices destruíram o jornalismo que antecipou tudo o que o nazismo iria acabar fazendo anos depois. Os nossos jornalistas assustados entenderiam a tentativa de destruição do jornalismo dito alternativo no Brasil, no contexto seletivo da Lava-Jato.

Há uma evidente articulação para que só a imprensa golpista sobreviva, com sua particular visão de liberdade de expressão e de pluralidade. Como fizeram na Alemanha dos anos 30, com a articulação que envolvia também o judiciário.

É muito diferente do que se passou com a imprensa na ditadura no Brasil. Na Alemanha, o jornalismo engajado à social-democracia alertou: o terror vai se disseminar pelo país. Aqui, a imprensa foi protagonista do golpe de 64 e da ditadura, para somente depois tentar reagir ao horror que havia ajudado a fomentar.

Sim, o jornalismo que advertiu para a chegada do nazismo era militante (sustentado pelo partido de centro-esquerda alemão) no valente semanário Münchener Post, de Munique.

No Brasil, a imprensa de hoje volta a fazer militância pela manutenção do golpe, por vocação. Quem discorda, fora do esquema, que se prepare para a caçada. Não há espaço para discordâncias.

Por isso os jornalistas silenciosos devem ler o livro de Silvia. São outros contextos, outras histórias, cada uma com a sua dimensão. Ninguém pretende comparar o nazismo a quaisquer regimes autoritários. Mas os modelos, no que têm de essência, são sempre convergentes, com dominação da imprensa incômoda, do judiciário, das instituições.

Silêncios foram decisivos, em todos os tempos, para que ambientes de exceção se afirmassem como normalidade. Silêncios não são neutros, são cúmplices.

Moisés Mendes é autor de Todos Querem Ser Mujica, livro de crônicas editado pela Diadorim.

One thought on “É silêncio demais

  1. Moisés Mendes é um articulista e cronista coerente com o nosso tempo é atento às transformações dá sociedade!
    Vou procurar o título que. Ele destaca neste artigo.
    Há uma intensa e profunda transformação em marcha no Brasil e precisamos todos romper o silêncio é não são somente os jornalistas!

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